ATENÇÃO: Isso não é um texto com dicas (5 reflexões sobre meu primeiro ano como autor independente).

Há um ano atrás eu lançava minha primeira noveleta de forma independente na Amazon. Lembro como se fosse hoje do frio na barriga de ser lido (talvez) por muitas pessoas pela primeira vez. Conhecia poucos dos desafios que iria encontrar no percurso, e hoje, olhando para trás, agradeço por ter aprendido tanta coisa.
A Poção do Amor, lançado dia 02 de setembro de 2020, depois de um longo ano de escrita e trabalho, chegou ao mercado com um boom um tanto quanto programado. Havia passado longos meses daquele ano estudando o mercado, os autores, as publicações e as estratégias que poderia usar. Decidi fazer tudo da forma mais profissional que conseguia: Investi numa capa ilustrada por não só uma grande profissional como também uma grande amiga (a importância da capa como primeiro contato com o leitor foi algo que notei durante meus estudos), trabalhei o texto com nomes relevantes do mercado independente e contei com a incrível ajuda do Sem Spoiler – maior perfil de literatura do Twitter – no anúncio oficial.
Lembro de estar na casa da minha irmã para um almoço em família naquela manhã ensolarada, como todas as outras por aqui. O anúncio saiu quase meio dia de um domingo e eu senti todas as borboletas que estavam dentro do meu estômago saírem voando pela boca. A sensação foi surreal. O tweet do Sem Spoiler teve um alcance gigante devido principalmente a capa, o que me proporcionou dezenas de seguidores, curtidas e comentários.
Com este anúncio atingi um dos meus objetivos iniciais: ser visto.
De lá pra cá, muita coisa aconteceu. Lancei uma novela no mesmo universo, lancei meu primeiro conto por uma editora e aprendi muitas coisas. Mas esse não é um texto de dicas, longe disso. Esse texto é sobre minha experiência.
Atenção, todos os pontos aqui citados partem de uma perspectiva de privilégio de quem tem um trabalho CLT que ajuda a bancar a escrita.
01 – Ter objetivos (e paciência) me ajudou muito.
Antes de lançar eu já tinha em mente meu objetivo de ser visto, mas ao longo desse ano aprendi a ter objetivos ainda mais traçados a curto e longo prazo. Me perguntei: O que eu quero com a escrita. Quero ser lido? Quero montar carreira? Quero ser famoso? Quero levar minha história pro mundo? Qual meu objetivo? Saber algumas dessas respostas me ajuda a ter paciência e traçar caminhos para atingir esses objetivos.
Meu objetivo inicial era literalmente chamar atenção. Por isso investi dinheiro do meu próprio bolso pra lançar A Poção do Amor. Eu queria quebrar uma bolha, queria ser visto e ser lido, acima de tudo. Sabia que sozinho – e com meus conhecimentos limitados – não conseguiria a projeção que desejava. Um dos motivos que demorei a lançar minha história foi que eu queria trabalhar com profissionais que me ajudassem a levar o melhor dela pro mundo. Queria uma capa que chamasse a atenção e que induzisse a leitura.
Isso tudo me levou a investir financeiramente mais do que a maioria investiria em um primeiro lançamento. Passei meses juntando essa grana e quando olho para trás, faria tudo de novo.
Falo sobre objetivos (e paciência) pois vejo muitos autores iniciantes (eu incluso) frustrados com alguns aspectos do mercado, que não é fácil pra ninguém. O que me ajudou a aliviar essa sensação foi colocar em mente que o caminho é e vai ser ainda mais doloroso para qualquer pessoa que assim como eu não faça parte do eixo sul/sudeste. Essa inclusive é uma discussão para outro dia, porém muitas das vezes durante esse um ano eu senti que mesmo que eu apresentasse o melhor trabalho que eu conseguia dentro dos meus limites ainda não era o suficiente para um mercado que mesmo que negue ainda é autocentrado.
(Ok, talvez essa parte tenha sido uma dica).
02 – Ser profissional (mas nem tanto) me abriu os olhos.
Em decorrência do primeiro ponto, eu aprendi durante esse ano que ser profissional faz muita diferença. E não digo que ser profissional no sentido formal da palavra, mas sim no sentido que diz respeito a como você se apresenta pro mundo. O Twitter, principal rede social que utilizo atualmente, está cheio de autores e isso é incrível, mas você precisa se destacar para atingir seus objetivos. Eu tenho a sorte de trabalhar com design, ter amigos fotógrafos, conseguir investir do meu próprio bolso, mas nem tudo se resume a isso. Ser profissional diz respeito bem mais a sua postura enquanto pessoa e autor, do que qualquer outra coisa. Seja consciente que a bolha do mercado editorial é minúscula, por isso seja educado acima de qualquer coisa. As pessoas conversam, as pessoas se conhecem. E as pessoas vão falar de você, bem ou mal.
Porém, não se apegue a isso. Ser informal e natural também é necessário, e essa é uma lição que ainda tenho que aprender.
Desde o início quis ser O Autor Profissional. Cheguei a apagar tweets e mais tweets por não encaixarem na minha persona enquanto autor e isso aos poucos foi me tirando o prazer de compartilhar meus pensamentos que não tinham nada a ver com a escrita. Até hoje luto contra a sensação de querer estar sempre polido nas redes sociais. Não faça como eu, aprenda um meio termo.
Com isso aprendi a lidar comigo mesmo mais do que qualquer coisa. A pressão em ser o autor perfeito nas redes sociais começou a diluir, mas ainda não o suficiente. Acredito que estou no caminho e talvez esse texto tão pessoal seja um desses passos.
03 – Preciso aprender a lidar com minhas expectativas
Essa eu digitei rindo. Sou o rei das expectativas, mas queria dizer que aprendi um pouco a lidar com elas, ou pelo menos estou tentando.
A ideia de ser escritor ainda é muito romantizada. As pessoas criam muitas narrativas sobre escritores de sucesso, sobre histórias de sucesso, mas o que eu vi durante esse ano foi que nem tudo se resume ao que a gente vê. A comparação é inevitável e não estou dizendo pra você não se comparar (comparação às vezes é bom, cria um norte a ser seguido). O que quero dizer é que você tenha noção que o mercado vai devorar você, de várias formas. As pessoas não perdoam se você é iniciante. Algumas delas vão sempre cobrar muito de qualquer pessoa que esteja tentando essa carreira PRINCIPALMENTE se você está tentando essa carreira de forma profissional, como eu.
E é daí que a expectativa parte. A expectativa própria de alcançar os mesmos objetivos que fulaninho, a expectativa do outro de que eu escreva o que ele quer ler e a expectativa de lançar cada vez mais histórias antes de ser esquecido. Muitas dessas expectativas eu lido constantemente. Querer agradar o outro e me questionar o motivo de ainda não ter alcançado o mesmo que outra pessoa me assombra mais do que eu gostaria. Por isso, é preciso ter pé no chão e ser humilde e honesto com você mesmo.
Ser pé no chão foi algo que aprendi e que levo comigo em todos os âmbitos da minha vida e que já me ajudou muitas vezes. E com a escrita não foi diferente.
04 – As pessoas são subjetiva, igual sua história.
Lidar com críticas é muito difícil. Isso eu aprendi na marra.
Para falar a verdade nunca fui uma pessoa boa em lidar com críticas negativas, mas aprendi a criar um filtro para elas desde que escrevi minha monografia na faculdade. No trabalho estudei a subjetividade do indivíduo e como o processo de criação de sentido para com as mídias é uma coisa altamente única e contextualizada a partir das experiências individuais de cada um. Com isso sempre em mente eu relevo a maioria dos comentários negativos sobre minhas histórias, pois sei que as pessoas são diferentes e têm e tiveram uma vida completamente diferente da minha. Tenha sempre em mente que sua história será lida por pessoas dos mais variados tipos e com as mais variadas vivências. Talvez não se identifiquem com sua história, com seus personagens e com os dilemas escritos por você, mas tá tudo bem.
É difícil, não vou mentir. Às vezes o feedback de alguém “importante” do mercado sobre meu texto tem a força de me fazer questionar tudo que eu já escrevi na vida. Nessas horas respiro fundo e digo a mim mesmo para não me apegar nessas palavras, e sim me apegar no que eu acredito.
Por isso, deixei o próximo ponto por último.
05 – Acredite na sua história.
Talvez esse seja o ponto mais importante aqui. Escrita pra mim sempre foi algo distante, algo que via concretizado em livros que eu nunca poderia escrever. Era assim que eu pensava. Afinal de contas qual motivo levaria pessoas a ler o que um menino do interior do Rio Grande do Norte tem a dizer? Era o que eu pensava. Por muitos anos me privei da escrita por pensar assim, até que comecei a me ver nos livros que lia.
Tudo começou com Quinze Dias, do Vitor Martins. Me encontrei enquanto menino gay e gordo vivendo dilemas sobre relacionamentos e por muito tempo foi o suficiente, até que encontrei outras características minhas em outros livros. Me vi enquanto nordestino nas histórias mágicas e fantásticas que encontrei na Amazon e que eram escritas por pessoas parecidas comigo. E foi quando a chave virou na minha cabeça e abriu um novo caminho.
Pandemia. Começo de 2020. Eu descobri a literatura independente e nacional e nordestina e queer. Foi um caminho interessante, de descobrimento e de estudo, mas acima de tudo de identificação. Esse caminho me ensinou algo que eu nunca vou deixar tirarem de mim: eu acredito nas minhas histórias.
Acredito que minha história merece ser contada. Acredito que as histórias contadas por um menino do interior do Rio Grande do Norte merecem ser lidas. Acredito acima de tudo que eu posso escrever e isso é o suficiente. Ninguém nunca vai tirar isso de mim, pois desde que lancei A Poção do Amor as pessoas me leem e gostam do que leem. A Poção virou um pequeno hit na comunidade de leitores, e digo isso sem presunção porque já vi pessoas que nem me seguiam comentar que conhecia a capa, conhecia a história. A noveleta conta com mais de 360 avaliações na Amazon, 30 mil páginas lidas no K.U. (o que é bastante se considerarmos que a história tem 42 páginas), e centenas de e-books vendidos.
Mas acima dos números, as pessoas. Sempre. Gosto de pensar que a história encontrou quem precisava encontrar.
As pessoas que conheci desde então me ensinaram a acreditar em mim e ainda mais nas minhas histórias. Sou muito grato a cada leitor e autor que posso chamar de amigo, pois foram eles que me ajudaram e deram forças para continuar nessa jornada insana.
Talvez todo esse texto seja um devaneio de alguém que vem refletindo muito sobre os pontos aqui apresentados e como eles vão reverberar nos meus próximos anos como escritor, ou talvez seja um desabafo de alguma forma. Ou talvez tudo isso. Não planejei um final, da mesma forma que não planejei muitas das coisas que aconteceram neste ano. Por isso quero terminá-lo com um conselho:
Acredite na sua história. Acredite no poder das suas palavras. Pois alguém está disposto a ler o que você tem a dizer, alguém está disposto a ler sobre sua pequena cidade do interior e os causos que só você conhece. Alguém está disposto a ler as gírias e sotaques que você achou que ninguém de fora da sua cidade entenderia.
Alguém lá fora está disposto a acreditar em você. E isso é o suficiente.